boas portellini
Gostava que me esclarece-se se possível a mim e a todos que andam nas estradas a praticar este desporto chamado cicloturismo. Recebi um mail a dar-me conhecimento que um colega nosso teve um acidente numa nacional bastante larga, e por isso tinha uma berma, ou zona de paragem de socorro, também ela larga. Foi abalroado por um carro nessa mesma zona de segurança. Ou dito por outras palavras, para não estorvar os senhores condutores ia fora da nacional na totalidade. Conclusão, recebeu uma carta da seguradora do condutor do veiculo, a dizer que não se responsabilizava pelo o acidente, visto que o ciclista não ia na faixa de rodagem. ISTO SERÁ POSSIVEL NUM PAIS CIVILIZADO???
Se me souber responder fico-lhe grato.
Caro kalinas,
Sem me pronunciar sobre os contornos específicos do caso, porque não há informação suficiente, a circulação da berma é, à luz do Código da Estrada ainda em vigor (o novo só entra em vigor em 01/01/2014), ilegal e punível com contraordenação.
Dispõe o art. 17.º do Código da Estrada, que
os veículos só podem utilizar as bermas ou os passeios desde que o acesso aos prédios o exija, salvo as exceções previstas em regulamento local. Dispõe no número anterior é sancionado com coima de € 60 a € 300, sendo as coimas coimas para os ciclistas de metade destas.
Quando um veículo que circula numa estrada provoca um acidente, tenha ou não culpa, é responsável pelo mesmo, nos termos do art. 503.º do Código Civil. No entanto, mesmo na colisão de veículos,
se a parte lesada (neste caso, o ciclista) está em infração, os prejuízos do acidente são repartidos de acordo com a contribuição da culpa de cada um dos condutores (artigo 506.º do Código Civil).
Contudo, os sinistros rodoviários são sempre ingratos em termos de prova, especialmente no caso da colisão de veículos (ou porque ninguém viu, ou as testemunhas zarparam porque não se querem aborrecer). Ou seja, é possível assumir (e altamente provável, na normalidade das situações) que o automóvel tenha contribuído muito mais para o sinistro (os danos) do que a bicicleta, porque:
(i) o carro é mais pesado e tem uma maior massa, o que permite empurrar e fazer despistar os ciclistas em caso de toque ou proximidade excessiva;
(ii) o automóvel é suposto circular na faixa de rodagem, contudo, se foi para a berma por uma questão de emergência ou mecânica é diferente se isso aconteceu devido a uma distracção do condutor;
(iii) e embora o ciclista estivesse na berma em infracção, a verdade é que a conduta do automobilista não é indiferente à produção dos danos tal como aconteciam.
Claro que podemos e devemos defender um tratamento mais benéfico dos ciclistas e peões, mas esse tratamento não resulta da Lei actual. Só futuramente, a partir do próximo ano, há esse tratamento especial e essa atenção especial ao ciclista.
Nestas situações é comum as pessoas não se aborrecerem com o caso caso não haja grandes danos, físicos ou materiais, por causa dos custos. Ao abrigo do novo Código, em princípio, vai valer (mais) a pena, porque o ciclista ganhou diversos direitos e certos comportamentos anteriormente ilegais passaram a ser legais por mais seguros.
É natural que a seguradora se escuse a aceitar a respondabilidade do seu segurado, aproveitando a infracção do ciclista lesado. E naturalmente aproveitam o deficiente reconhecimento da bicicleta enquanto veículo (e os baixos danos que normalmente daí resultam), tanto mais que até com os acidentes com os automóveis se comportam dessa forma.
Finalmente, a partir de 01/01/2014 vai ser permitida a circulação na berma (quando seja boa e não prejudique a segurança de peõe que aí circulem), bem como a circulação em toda a faixa de rodagem (embora sempre do lado direito, a não ser que haja perigo).
Espero ter ajudado.