Subida à Sra. da serra no marão,volta medonha.
Depois de quase um ano a treinar para participar em provas de XCO e algumas maratonas.
A ter que cumprir um plano de treinos, a ter que fazer rolo quando me apetecia andar de bicicleta na estrada, a ter que rolar quando me apetecia fazer subidas, a ter que fazer 1:45 de rolo quando me apetecia andar o dia todo no monte com os meus amigos.
Ter qua efectuar séries, 30x30 e coisas tais, suar como um javali em cima do rolo a olhar para a porta da garagem.
Não é isto que eu quero para mim, eu quero andar quando eu quiser, como quiser, poder andar com os meus amigos e colegas, sem ir sempre a competir, ou então andar sozinho o dia todo sem destino, sem preocupação com médias, com ritmos cardíacos, etc.
Gosto de fazer provas, mas é quando me apetece e ir às provas que eu quero, não às que me são impostas.
As provas que fiz correram muito bem, até bem demais talvez, pois isso levou-me a tentar treinar cada vez mais e tentar ser cada vez mais forte e andar mais que os outros, mas isso não me trazia alegria, não pedalava por gosto, mas por obrigação.
Deixei de fazer no verão a travessia de Portugal pela Nº2 não pude fazer o Brevet dos Randonneurs, deixei de fazer uma voltas das boas com o meu grande amigo Pedro.
Por tudo isto quando acabei a última prova disse para mim mesmo, chega não é isto que me faz feliz.
Assim sendo de lá para cá tenho andado a recuperar as minhas voltas, já subi a Penha, já fui 2 vezes subir S. Bento de Pêras a Vizela, subida curta mas das que fazem sofrer e aconselho todos que não conhecem a lá ir, nem que seja pela vista e pelo miradouro.
Dia 9 de Novembro estava de folga, sábado tinha uns colegas que iam fazer Porto- Régua sempre a abrir, mas eu queria outra coisa, queria subir e estar sozinho, por isso meti a Massi no carro e fui até Amarante com ideias de subir á Sra. da Serra no Marão
Na Maia estava um dia normal, sem frio mas ameaçar chover, por isso vesti calções e uma camisola fina por baixo do jersey de manga curta, enfiei o corta-vento na mochila só para o caso de precisar na descida.
Chegado a Amarante, estava mais frio que na Maia e também nevoeiro, mas não chovia.
Tomei um café em frente à igreja de S. Gonçalo e como estava com o equipamento que comprei durante a volta a Portugal o cor-de-rosa da Efapel/Glass drive veio um tipo ter comigo perguntar-me se eu era ciclista da Efapel, não amigo, eu sou só um empenado que têm um equipamento deles, diz o fulano você é tão magrinho que pensei que fosse?
(Vem diz a minha mulher daqui apouco desapareces) pesava em Janeiro 72kg peso actualmente 64kg, tenho um 1,73m.
Sai do café atravessei a ponte e praticamente começa-se a subir em direcção ao Marão, conforme fui subindo, o nevoeiro foi-se tornando mais cerrado e de vez em quando chuviscava, mas estava feliz a subir no meu ritmo conforme fui subindo o nevoeiro foi se tornando cerrado, só via meia dúzia de metros à frente mas não tinha frio.
Ia com um bom ritmo mas sem stress, pois sabia que até ao topo na Sra. da Serra são 38km sempre a subir e que quando chega-se à ponte que passa por cima do IP4 ainda faltavam 10km e os mais duros.
Quando passei à pousada do Marão o nevoeiro era tanto que só me apercebi da pousada por causa do Muro, chegado à ponte do IP4 á que virar à direita e começa logo uma daquelas rampas que me fazem sofrer mas das que eu gosto, a meio dessa rampa estavam 2 ou 3 carros parados com os atrelados de transportar os cães de caça ainda pensei com este nevoeiro vou ser confundido com um coelho e vou levar um tiro.
Passada esta primeira rampa existe uma pequena descida e um pouco de plano mas a estrada está em muito mau estado é só buracos por causa do estado deste troço até à Sra. da serra estar tão ruim é que este ano não se realizou a subida que estava prevista nas serras míticas.
Mais é frente vem o pior bocado uma rampa com cerca de um km com uma inclinação brutal no GPS dava em alguns locais 37% de inclinação, mas sei que é erro, mas são uns 20% de inclinação sem sombra de dúvida.
Como não via muito para a frente lá ia pedalando, mas só pensava nunca mais acava a subida, o nevoeiro aqui foi amigo, pois como não via onde terminava a subida não desanimava e lá ia subindo, sabia que a rampa era dura pois já a tinha subido com o Carlos e Pedro e só de olhar para ela até tínhamos vontade de desistir lembro –me de dizer ao Carlos, quando ao longe vimos esta rampa nós vamos ter que subir aquilo, desta vez não me custou tanto pois não via a subida era só ir pedalando , bufar, gemer e esperar que a rampa acaba-se.
Quando esta rampa terminou fica-se num planalto desamparado sem arvores ou rochas e como já estava a 1000 e muitos metros de altitude o vento soprava com muita força e começou a ficar muito mais frio o vento era tanto e isto não é exagero, que eu via na estrada o nevoeiro a passar à minha frente empurrado pelo vento, aqui começaram as dificuldades quase que não conseguia pedalar, o vento atirou-me ao chão, mas lá me levantei e estive quase para dar a volta e descer, mas como faltava pouco para o topo lá prossegui , na última rampa que é em pedra antes de chegar à capela as rodas resvalavam devido à inclinação e ao empedrado estar molhado e o vento era cada vez mais forte.
Quando cheguei à capela tirei uma luva para tirar uma foto e foi quase automático fiquei com a mão gelada.
Como parei arrefeci em questão de um minuto, só consegui tirar duas fotos, foi vestir o corta vento e começar a descer.
E foi na descida que começou a minha tormenta, com a roupa molhada debaixo do corta vento, as mãos completamente congeladas as luvas que levava umas Nalini não têm silicone nas pontas dos dedos, escorregavam nas manetes, não conseguia travar devido ao frio nas mãos, a estrada toda esburacada, começaram-me os músculos dos braços a tremer o que é uma reacção natural do corpo, quando começa a entrar em hipotermia os músculos tremem para gerar calor, comecei a ficar com os músculos dos maxilares paralisados devido ao frio não conseguia abrir a boca, comecei a ver o caso mal parado.
Só pensava se a bicicleta fura, se me sai a corrente, ou se caio nunca mais consigo sair daqui, temi pela minha vida, só pensava nos meus filhotes, mas apesar de tudo consegui manter sempre a calma e foi o que me safou, conforme ia descendo comecei a pensar tenho que conseguir chegar aos caçadores para pedir ajuda, como é quase sempre a descer durante 10km não podia pedalar, comecei a sentir caibras nas pernas devido ao frio, cada vez estava mais preocupado, mas os km iam passando e a Massi e as rodas Dura Ace aguentaram tudo.
Quando cheguei onde estavam os caçadores, já não estavam, tinham ido embora, parei para telefonar, não tinha rede.
Só me restava chegar á estalagem, conforme ia descendo também ia ficando menos frio quando cheguei à Nº 15 o piso está bom, sempre que podia pedalava para aquecer então lembrei-me, se comer estou a introduzir energia no organismo e ajuda a aquecer, comi tudo o que tinha figos, sultanas, avelãs,( quando vou fazer voltas maiores levo sempre numa saca frutos secos) um cubo de marmelada as gomas da ZIPVit que têm proteína.
Conforme ia descendo a Nº 15, as coisas iam melhorando, quando passei à estalagem optei por não parar, tinha frio mas já era suportável só queria chegar ao carro e ligar o aquecimento no máximo, por isso nunca mais parei e sempre que podia pedalava.
Quando cheguei a Amarante e me apanhei dentro do carro até pensei que era mentira.
Esta volta podia ter-me custado a vida, cometi vários erros:
1º não devia ter subido a serra com aquelas condições.
2º quando comecei a sentir que o vento estava muito forte devia ter voltado para trás.
3º devia ter levado uma mochila e um blusão térmico para uma eventualidade, pois na mochila não me pesava.
4º e mais grave não disse a ninguém para onde ia, devia ter pelo menos avisado a minha mulher para onde ia andar, logo se alguma coisa corresse mal ninguém sabia onde eu estava.
Por tudo isto esta volta foi a mais dura e difícil que alguma vez fiz e aprendi uma lição de vida. Espero que ao partilhar este relato possa servir de lição para que outros não cometam os mesmos erros que eu cometi.
Quanto a minha Massi portou-se sempre à altura dos acontecimentos, cada vez gosto mais desta bicicleta, as rodas que montei à pouco são simplesmente fantásticas a subir e já vi que podem levar porrada que aguentam, fiz uma boa escolha Dura-Ace C24
Porque andar de bicicleta deve ser motivo de alegria, satisfação pessoal, bem estar com nós e com o ambiente que nos rodei-a, um modo de estar na vida, nunca o motivo de infelicidade ou de insegurança.
Deixo aqui os dados desta volta que acabam por ser o menos importante no meio de tudo o que passei:
Km-----77,4
Horas---3:31
Média---21,9 kmh
Acumulado de subida---3299
As poucas fotos que consegui tirar e uma foto das rodas Dura-Ace montadas: